quinta-feira, abril 21, 2005

Dá Deus Pacientes a quem não tem métodos terapêuticos actualizados:)

Written has Freud



O terapeuta não se pode dar ao luxo de começar do 0 no seu contacto com os pacientes. Não existem “fresh starts” e o simples facto é que os pacientes não estão felizes por nos verem. De facto, muitos deles só ao chegar à porta do consultório é que finalmente vão admitir, para alguém além deles próprios, que existe um problema na vida deles e portanto isso custa profundamente em relação àquilo que está assente no seu julgamento mais profundo, no julgamento mais profundo do ser humano: a ideia de que devemos pensar por nós e não sob influência de alguém. E isso, como é óbvio, não é fácil… para ninguém… portanto, não é fácil conhecerem-nos, não é fácil estarem aqueles 10 minutos à espera, que para nós parecem voar dado que estamos a tentar espremer um outro paciente. Portanto a “lavagem” é fundamental entre pacientes.

A lavagem é uma saída daquele triunfalismo quase sempre presente no fim das sessões e a transição para um estado pessimista em relação ao próximo paciente. É um ritual importante, pois vai-nos permitir voltar a estarmos conscientes de que não somos senhores da verdade absoluta. O meu ritual é bastante simples e julgo estar aqui a revelá-lo pela primeira vez. Sou um bom jogador de damas, e portanto entro nas “Damas Online” do Microsoft Windows XP e jogo alguns jogos. Em vez de estudar as jogadas desde o início, faço 2 ou 3 primeiras más jogadas e depois tento recuperar jogando até ao fim. Como jogo sempre no nível expert, fazendo os 3 primeiros movimentos ao acaso, normalmente o outro jogador que me foi aleatoriamente atribuído pela rede de jogos toma a dianteira do jogo, ganhando-me a maior parte das vezes. E portanto essa frustração, multiplicada por 2 ou 3 jogos, vai contribuir para o meu regresso à terra, para a aceitação da minha falibilidade e reintegração do meu “eu” por oposto ao “super-eu” em que estava situado no momento em que o último paciente. Claro que para quem espera mais 5 minutos a mais depois de ter visto o outro paciente sair isto também não é bom, mas na maior parte dos casos ajuda a diminuir o pânico do “é a minha vez”, pois a pessoa já sabe que estou desocupado e portanto, a pessoa tem um pouco de espaço entre o “é a minha vez” e o “vou ter de entrar”, e esse tempo tem esse factor benéfico porque nervosa a pessoa já estava quando chegou à sala de espera não é?

Além disso existem pacientes que estão ansiosos para falar, pacientes de 5ª ou 6ª sessão, já habituados À minha presença, que entre sessões seguem passos para começar a resolver os seus problemas e que face a sucessos nesse percurso estão ansiosos para mostrarem resultados, pois assim como manifestaram a mim o problema, também esperam que ao manifestarem a mim a solução se complete o circulo que os conduziu àquela sala decorada com muito mau gosto : )

Sim, porque a percepção do terapeuta não é igual no início ou no fim de um processo de 10 ou mais sessões. O importante é não estabelecer declives elevados nas sessões, ter uma noção que uma sessão em que se vai muito longe pode ser uma sessão que terá de ser revista na sessão seguinte sob pena que se esteja a forçar muito depressa a psique da pessoa a lidar com questões que podem parecer topicamente tratadas mas estão muito mais enraizadas. E isso é fundamental, a procura de raízes nos problemas e questões tratadas, não nos ficarmos pela satisfação de um ramal exposto na folhagem da vida de alguém. É preciso acima dos traumas, acima dos desvios, procurar as condicionantes dos desvios. Pensemos nas emoções como um rio que corre. Podemos montar uma barragem no rio, fazer um dique, mas será sempre uma solução externa a ele, e barragens e diques não rimam muito bem com emoções, que são bastante mais fluidas e portanto menos facilmente impermeabilizáveis. É preciso conseguir alterar a paisagem de forma endógena, mudando os pontos de acumulação de água pluviais, vulgo exterior, mudando a profundidade do rio, o lastro que as pessoas carregam, trabalhando no declive à volta das realidades da pessoa mas sem provocar demasiados artificialismos nas perspectivas que a pessoa tem de si própria. Muitas vezes o maior pecado do terapeuta é precisamente achar que compreender absolutamente o paciente que acaba por chegar, por uma via perfeitamente racional, à posição compadecida de tantas pessoas amigas do paciente. Achámos ter um conhecimento tão absoluto através daquele pequeno sketch que nos parece quase certo que temos em vista as escolhes exactas para a pessoa e que ela não será capaz de tomar medidas racionais dentro de si própria para ultrapassar os obstáculos naturais que lhe surgiram no percurso. Aliás, esta questão de endogeneidade da terapia é fundamental para o conceito de integração do terapeuta no universo referencial do paciente. A entrada demasiado rápida por um percurso de explicação traumática ao paciente, a facilidade exagerada com que se sobrevaloriza uma determinada dimensão da personalidade do paciente fazem-nos por vezes esquecer que ele não se encontra no nosso plano de consciência mas no seu plano de consciência mas no seu próprio e é nosso o trabalho de ir até ao dele e não o caminho inverso. Prefiro muitas vezes passar todas as sessões excepto a última a falar do próprio paciente do que tentar em cada sessão deixar uma pequena receitazinha emocional para cumprir durante a semana. Prefiro dedicar todas as sessões a aprender a ver como o paciente se vê para na última sessão mostrar-lhe o próprio mundo dele com os meus olhos de forma clara que o deixe completamente confiante que estou a olhar de uma posição correcta e real, e portanto se eu estou a ver bem, o que digo naquele momento é interiorizado muito mais profundamente do que todos os outros pequenos recados enviados de forma mais ou menos abreviada, como resumo de qualquer coisa, como parte de qualquer coisa. Muitos de vocês dirão “nunca conheci nenhum terapeuta que fizesse essa abordagem”. Pois… mas o problema está mesmo aí: quantas universidades portuguesas é que utilizam sistemas de psicologia modernos adaptados a pacientes individuais e não conjuntos de chavões mais ou menos adaptativos sobre o que o paciente quer ou aquilo que o paciente pensa?

Pois… bem me pareceu… : )))))))))