Leonardo DaVinci, a Tia-Pai, o Falo na boca de São João e uma serpente que anda por aí ( e um terapeuta com uma fixação por analisar pinturas)
Written as FREUD
Recentemente um colega pediu-me pra revisitar o quadro de Leonardo Da Vinci “Santa Ana, a Virgem, o Menino e São João Menino”. É um regresso pois fiz um estudo muito extenso deste quadro nos meus tempos de estudante, reflectindo sobre o visionamento do Abutre que Freud sugeriu na sua palestra em 1910 sobre outro quadro: “ A Virgem, o Menino e Santa Ana). De facto, é evidente a construção de um abutre do canto superior direito da pintura, elemento perturbador num quadro idílico e bucólico. Mas a minha reflexão não foi tanto sobre esse elemento mas sobre o olhar de Santa Ana e parti pra uma reflexão que citando o mesmo elemento biográfico da vida de Leonardo ( o facto de ser bastardo) se desenrolava noutro sentido explicativo do quadro ( o olhar perturbador e carregado de Santa Ana e a colocação das mãos de Maria sobre os genitais do Menino.
A premissa é simples: Santa Ana apercebendo-se do estímulo genital a Jesus por parte de Maria censura-a e corrige-a no papel de mãe, e é o filho dela que parece ter uma postura adulta, fruto de uma educação cuidada. Afastei-me assim do movimento clássico que usa esta imagética em tratados sobre homossexualidade pra mais perto da realidade familiar. Santa Ana é o Pai, e ele faz uma educação cuidada dos seus filhos, e Maria é a mãe, que quase deixa cair o menino e o castra pela sua omnipresença. O facto de o meu humilde estudo ainda hoje ser tão citado internacionalmente mostra a minha originalidade mas não a minha prossecução neste tema. De facto reflecti postumamente muitas vezes e das formas mais variadas sobre esta obra de arte. Em particualar, na ausência de S. João da pintura final. Será que morreu? Será que entretanto o falecimento do filho querido ao Pai fez com que ele tivesse uma candura anormal pra com o seu filho bastardo? Em ambas as pinturas a proximidade entre as duas personagens femininas é exasperante e rompe completamente com a distribuição figurativa da época. Na pintura final também é claro que Maria está sentada em cima de Santa Ana. Ora isto era muito comum na época, existem outros vários quadros de época, como os de Giotto, em que este elementos se cruzam mas em nenhum outro como neste quadro a intensidade final é tão vibrante. Maria já não toca e amachuca os genitais do Menino, e prepara-se pra o tomar no colo, ao contrário da pintura preparatória em que parece se preparar pra o abandonar. Além disso o Menino parece ter-se apoderado do Carneiro de São João, tendo este saído de cena, e o lado direito do quadro é o mais escuro, como que se João fosse “apagado da imagem”. Mas procurando bastante em numerosa biografia da época de Leonardo concluo que o filho mais velho de um dos nobres apontados como seu pai, o Conde de Ricci, se perdeu numa caçada no ano de 1506. Dada a data dos desenhos e a data do quadro final parece evidente a ligação entre a floresta, o desaparecimento de São João, a proximidade mais intensa entre Santa Ana e Maria ( de consolo talvez) e a clara fixação do olhar do Menino nos progenitores e não no seu irmão rival. Além disso, o olhar de Santa Ana no primeiro quadro revela uma clara atracção sexual por Maria, mostrando-se Santa Ana desdenhosa em segurar a criança e desejando Maria, mostrando a sua recusa em aceitar o Menino-Leonardo. Alías, a maõ improvisada pelo pintor aponta pró alto, chamando talvez a atenção pró facto de existir uma ligação fundida na Igreja que a impede de ter esse gesto com a criança ( falo obviamente do casamento que o Conde tinha). Além disso confundido com o aparente sinal de benção de Jesus a João está uma tentativa de Leonardo de tocar o Pai, uma tentativa que ele frustra afastando o seu braço. Em ambos os quadros sob os corpos fundidos das duas mulheres sao um elemento serpentino, elemento agudizado pelo facto de no primeiro caso o elemento serpentino estar em relevo ( devia portanto ser mais bem definindo) e no segundo caso estar na sombra ( em todos os quadros de Leonardo há um enorme cuidado no desenho dos pés quando eles são representados. De facto, esta serpente que sai em ambos os casos de dentro das mulheres foi representado como o pecado que era expiado mas pra mim parece evidente que o facto de o ponto de partida serem as próprias mãe e tia do Todo-Poderoso prá erupção da serpente reflecte o caráter ilegitimo da relação em que eles estavam envolvidos, os pais de Leonardo. No quadro com João há uma mão que segura o torso do Menino. Essa mão corresponde à posição inicial de Santa Ana, mas depois foi corrigida prá de Maria e está anomicamente incorrecta em relação à Virgem. Talvez tenha sido uma forma de chamar a atenção de Leonardo prá falta de apoio que teve na sua vida, pois o corpo do menino sem essa mão torta cairia mas a posição em que ele está a ser seguro não é nada confortável. Além disso, e este elemento só muito recentemente foi salientado ( Herkes, 2003), o braço incompleto de Jesus virado pra São João assemelha-se a um falo, num gesto de transferência de líbido, e aqui se justificaria a tal homossexualidade de Leonardo. Estou muito inclinado a aceitar esta perspectiva, principalmente por causa da dificuldade em Leonardo em falar de si próprio. Ainda uma última reflexão, esta de origem artística: o cuidado em salientar o pescoço de Maria como forma de reafirmar a sua feminilidade e a negação de um pescoço a Santa Ana em ambas as pinturas é evidente e os seus braços são muito mais grossos que os de Maria, realçando assim o desejo de separação dos elementos sexuais mariano e aniano. Mas isto sou só eu a falar ; )
Estou a divulgar isto em primeira mão neste blogue e espero seja do vosso interesse ; )